Um músico rock, Eric Draven (Brandon Lee) é trazido de volta à vida por um corvo, exactamente 1 ano depois de ter sido barbaramente assassinado e a sua namorada, Shelly Webster (Sofia Shinas) violada e espancada até à morte por um sádico gangue que invadiram o seu apartamento. Conseguindo ver pelos olhos do corvo, Draven é guiado na terra dos vivos até aos responsáveis pelos crimes de modo a que seja feita justiça e possa descansar em paz. Tendo como aliados a pequena Sarah (Rochelle Davis), a sua ex-protegida e o Sargento Albrecht (Ernie Hudson), despromovido a polícia-de-giro por indagar demais sobre o caso, Draven percorre a Noite do Diabo de 30 de Outubro tendo como alvos os membros do gangue: o lançador de facas Tin-Tin (Laurence Mason); o agarrado à morfina Funboy (Michael Massee); o desajeitado Skank (Angel Davis) e o execrável líder do grupo, T-Bird (David Patrick Kelly). Quando pensa estar tudo terminado, Draven descobre que um misterioso Senhor do Crime conhecido por Top Dollar (Michael Wincott) que tem uma relação incestuosa com a sua meia-irmã, a mortífera Myca (Bai Ling) poderá ter sido o responsável de encomendar o massacre...
Se "Batman" ('89) de Tim Burton abriu as portas para adaptações da banda desenhada de modo mais negro e sombrio, "The Crow" aproveitou bem a fórmula expandindo-a a um nível ainda mais pesado e depressivo.
Primeira longa-metragem do realizador vindo do mundo dos videoclips, Alex Proyas baseado na B.D. de '89 criada por James O'Barr, "The Crow" é um esplêndido filme de acção sobrenatural protagonizado pelo primogénito do lendário Bruce Lee, acidentalmente morto durante a rodagem do filme, devido a negligência da parte da equipe técnica.
Inicialmente produzido como um pequeno filme "directo-para-vídeo", mas com toda a publicidade envolta devido à morte do promissor actor e depois da Paramount Pictures largar o projecto, a Miramax com a bênção de Linda Lee Cadwell e Shannon Lee,
Brandon Lee como Eric Draven |
respectivamente a mãe e a irmã mais nova de Brandon, tomou as rédeas da produção, investindo cerca de 8 milhões adicionais para que se completasse o filme por intermédio de duplos e substituições digitais da cara do actor para assim poder ser concluído e estrear finalmente em cinema.
Rochelle Davis como Sarah |
Literalmente, "The Crow" é como um pesadelo que ganhou vida, um romance abruptamente terminado de modo trágico, tornado vingança pessoal pela justiça com um atormentado vingador
movendo-se num limbo entre a escuridão das trevas e o mundo dos vivos à beira da destruição e do caos, guiando-se por um corvo vindo do Além num ambiente soturno onde não resta esperança alguma para a humanidade.
"The Crow" é um filme atento ao seu estilo visual, mostrando-nos uma hipotética cidade de Detroit cinzenta, suja e mergulhada na anarquia relembrando os clássicos "Blade Runner" ('82) de Ridley Scott ou a Gotham City de "Batman" que nos transpõe de modo hipnótico para a acção e que apesar do semblante carregado e pesado do conjunto, o ritmo é estranhamente apelativo e dinâmico, nunca causando tédio no espectador.
Laurence Mason como Tin-Tin |
O argumento de David J.Schow e John Shirley livremente adaptado do material de origem, difere em diversos pontos com a obra de O'Barr e não pretendendo ser muito profundo na matéria, dá breves explicações para certas motivações da trama e não se preocupa em clarificar algumas pontas-soltas,
sendo o percurso da vingança irada de Eric Draven o fio condutor da história e o guião limita-se a segui-lo, que com a visão dantesca de Alex Proyas; a soberba cinematografia de Dariusz Wolski; todo o "design" de produção aplicado e as performances de um elenco bem seleccionado,
Ernie Hudson como Sargento Albrecht |
transformaram o que poderia ter sido um rotineiro filme-B, e o que acabou por acontecer com as malfadadas sequelas, num puro delírio visual e um inesquecível filme-de-culto que nos assombra até ao seu término.
Funboy (Michael Massee) & Darla (Anna Thomson) |
É impossível não associar a morte em cena do actor a toda esse sentimento de atracção no desconforto que "The Crow" nos provoca, porque em primeiro lugar é um caso tragicamente irónico da "arte imitando a morte" com Brandon a ser assassinado a tiro no filme por Michael Massee, o actor que deu vida a Funboy,
acabando por ser morto na vida real e tal como o seu personagem Eric Draven, o jovem de 28 anos Brandon Lee estaria de casamento marcado com a sua noiva, Eliza Hutton.
Cada frame em "The Crow" parece estar eternamente possuído pelo espírito atormentado do malogrado actor (mais uma vez, similar ao seu personagem no filme) tornando esta película uma experiência sempre arrepiante, mas fascinante de se seguir.
Skank (Angel Davis) & T-Bird (David Patrick Kelly) |
A título de curiosidade, Iggy Pop foi a escolha inicial do criador James O'Barr para o personagem Funboy, a que o conhecido cantor acedeu interpretar, mas devido a compromissos com a sua tournée Mundial desse ano, o cantor acabou por declinar a participação e Michael Massee entrou no seu lugar. Iggy Pop haveria de aparecer na inferior sequela "The Crow - City of Angels" ('96).
Top Dollar (Michael Wincott) & Myca (Bai Ling) |
Michael Wincott como o pérfido, mas suave vilão Top Dollar; Bai Ling como a sádica Myca; David Patrick Kelly à vontade neste execrável personagem desde o seu Luther do "The Warriors" ('78); a pequena Rochelle Davis de 13 anos e Ernie Hudson, como o polícia de bom coração estão muito bem nos papéis secundários.
Destaque ainda para a banda sonora, uma das mais vendidas até hoje, com as participações dos The Cure, que contribuíram com o tema "Burn" expressamente feito para o filme; Rage Against the Machine; Nine Inch Nails; Stone Temple Pilots; Violent Femmes; Pantera; Rollins Band; Helmet ou The Jesus and Mary Chain
Sofia Shinas como Shelly Webster |
e a trilha sonora original em tom taciturno de Graeme Revell, que compôs o tema central do filme "It Can't Rain All the Time" cantado por Jane Siberry.
Em suma, "The Crow" é um "comic book movie" que se destaca de outras tantas adaptações da banda desenhada.
Foi o filme de lançamento de Brandon Lee como actor principal, depois da sua participação como co-protagonista do actor sueco Dolph Lundgren em "Showdown in Little Tokyo" ('91) e o despercebido "Rapid Fire" ('92) e ao mesmo tempo o seu derradeiro.
É impossível saber que carreira teria tido o jovem actor se não tivesse falecido prematuramente ou se este filme teria tido o mesmo impacto crítico e comercial se o trágico acidente não tivesse ocorrido.
À falta de uma resposta concisa, fica esta melancólica e hipnótica obra de arte à disposição para ser para sempre revisitada, que a famosa revista Empire considerou como um dos 500 melhores filmes da história do cinema.
Género: Acção / Fantasia.
Fotografia: Côr.
País: E.U.A.
Duração: 102 minutos.
Trailer: http://www.youtube.com/watch?v=gA6GYAtvNcs
Classificação: 9/10.
Reviewer: @ Nuno Traumas.
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